sábado, 14 de junho de 2008

Elegia Castanha

A desire like a sudden love
For something that is not here
And that I can never have

Alexander Search


Tenho quase vinte e três anos e apenas consegui
Beber as tuas mãos através da minhas,
Os teus lábios através dos meus dedos, sempre
Com a sensação de que, pela primeira vez em muitos
Anos, ando a beber tão devagar e tão pouco;
Tenho três razões para adiarmos a morte:
Eu,
Tu e
Um mundo nuclear que aos nossos pés não tardará
Em reproduzir centenas de arco-íris autoclonáveis;
Tenho a impressão que tudo não passa duma fantasia,
Que os teus os teus olhos não são tão castanhos
Quanto a tua roupa, que nos teus seios não poisam
Joanhinhas, enfim, que afinal tens tranças
Loiras e compridas para que os exércitos Gregos,
Depois de Tróia, não tenham que ouvir Freud
Explicar o significado de sonhar com coisas tão grandes.

Ouvi dizer que tens a pele mais branca que Lou Andreas-Salomé,
Nunca tocada pela mais explicação mais existencial do Século XX;
Que decoras o quarto com borboletas e afinal de contas
É no meu que chove;
Que passas noites em claro no teu quarto a chorar por, ao contrário
Da trágica Maria, nunca teres caído de cima do teu cavalo;
Que não cantas, que não comes, que não dormes;
Que és tão trágica, tão pouco felina, imagem cinematográfica
Dum desejo perdido no tempo em que as pérolas
eram transaccionáveis por amor.

Talvez te devesses chamar Sophia,
O nome que cresce a partir do lugar em que as ondas
O enterram, qual estrela-do-mar crespada pelos últimos
Raios de sol;
Talvez fosses feliz comigo ou talvez fosses febril, não sei,
Ontem escrevi o teu nome ao lado do meu numa
Parede do Metro,
Já há um ano atirei uma moeda a um poço
E pedi um desejo que não posso contar,
Mas que envolve o teu corpo nu e o meu, não
Muito afastados um do outro.

Não imaginas a paixão que me dás a sentir
Quando te amo de todas as maneiras numa
Rua que passa ao lado do vão de escadas
De que o Campos nunca teria falado
Se tivesse, como nós dois, Internet;
Não imaginas a sombra que fazes se morreres afogada no Sena
Er ruft spielt süßer den Tod der Tod ist ein Meister.

Só estatisticamente somos a mesma geração,
Apesar dos nossos dias serem inconsistentemente ligados
Pelo espaço que vai do meu casaco ao teu;
Só astrologicamente se explicaria que o teu 21
Seja o meu 13, a fechar um ciclo que
Só o futuro Terramoto de Lisboa há-de destruir.

Nunca esqueças o que te digo; Nunca reproduzas estas palavras;
Nunca deixes de acreditar que os meus poemas são falsos;
Nunca morras; Nunca te escondas; Nunca me mates;
E, acima de tudo,
Nunca duvides que se eu te beijasse
Todos os cavalos do rei e todos os homens do rei
Não conseguiriam refazer o teu corpo
Tal e qual eu o encontrei.


David Teles Pereira