quarta-feira, 16 de novembro de 2011

NOTA FINAL (quinto número)

sempre tão subtil às vezes dolorosa
a diferença entre os melhores
e os piores versos e nós

não queremos tanto ser poetas
como nos enchemos da vontade
de dizer o que escrevemos
e de outro jeito não podemos
ser lidos nem somos
por esses
que amiúde esquecem
como a poesia antes de tudo
é um feroz instinto

só assim aqui
estamos
com estes joelhos descarnados
como velhos contadores de histórias
oferecendo colo
a todos os demónios

e cada um
carrega na boca o seu inferno
terror e melodia
a pulsação de um astro
debaixo da língua na ponta
dela o céu inteiro
regaço onde a morte vem encostar
a cabeça e se põe a sonhar

no meio de todo o
ruído vã agitação e tola
ansiedade destes tempos
nessa espera que ata e se desata mas
sempre só prende o vazio
de novo se inventa um ritmo
predador um
uivo de fascínio sílabas
esfusiantes cheirando o rastro
de alguma presa

juntos por um
momento ainda que breve
como se chegam as palavras
cercando um sentido
terrível campainhas
delirando quando os limites
se desmancham

criar assim
enlouquecendo o silêncio
largar-lhe os cães até
que encurralado
o ouçamos soluçar no meio
de nós

fora
longe de todos os círculos surdos
de bordadeiras estúpidas
ralhando a oca literatice dentes
podres que aos pés lhes caem
e por aí ficam

a criatura é movimento
olhar intenso um tremor
encantado
colhendo imagens a escura
permanência dessa flor
que recita canta morde os lábios
magnífica
sua cor com gosto
a sangue

e como um eco cresce
esta mão abre sacode o tempo
quebra-o como a um relógio
e fá-lo fixar eternamente
a glória de um grito
vibrando neste timbre
rude marinho português

e assim
não um poeta
quando mais são mais
dezenas insolentemente
passando fogo
uma visão tremenda
e este fulgor
que à própria vida
oferece
uma medida