terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Natal

Há poemas que se parecem com animais famintos -
procuram vorazmente alimentar-se das metáforas mais puras
dos versos mais exactos, descarnando-lhes ritmicamente as sílabas -
como se as palavras realmente sangrassem ou importassem,
como se um poema fosse assim tão importante. E é.

Mas um poema não é tão importante como saciar a fome por dentro,
como preencher o vazio escancarado nos olhos de quem passa
e não diz a solidão, ou calar o grito que existe
no interior dos quartos - a dor espalhada nas paredes.
Há qualquer coisa que me desperta no natal: amor e ódio

é como se toda a tristeza do mundo se cobrisse de luzes
e eu fechasse os olhos para não ver.

Susana Almeida