quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

passa uma gaivota e apaga o sol
ela diz,
mar-azia do ventre contraído na areia como túmulo,
pó de arroz e sal no rosto repetido na espuma,
há amar e amar sem haver um barco içado na boca que se navegue.
.
Ela diz, espelho,
vitrina de algas movendo o tempo ao longo da costa,
as costas ao longo do tempo
e o corpo à saudade do mar,
[mar é morto]
das mãos escavando o sexo aquático
dos sonhos.

passa uma gaivota e apaga o sol,
ela sente,
mulher de linho que enrola as ondas num vestido dourado,
[r]astro de sémen,
semeando uma âncora na fragilidade dos seus seios meninos,
seios de mel mãe,
regurgitando os seixos do amor.
.
Ela descalça,
os pés alvoraçados,
aves lançadas de um vôo surgindo na praia
como fragatas ao romper da manhã.

passa uma gaivota e apaga o sol,
ela diz,
e cai.

Nuno Araújo